“O Altíssimo deu aos homens a ciência, para que pudessem honrá-lo por suas maravilhas. Com os remédios o médico acalma a dor e, com eles, o farmacêutico prepara os unguentos: assim, suas obras não ficam inacabadas e a saúde se difunde sobre a terra” (Eclesiástico 38,6-8). Essa afirmação é de um sábio que, por volta de 185 aC, reuniu seus pensamentos no livro bíblico que chamamos “Eclesiástico”. Escrito em língua hebraica, meio século depois foi traduzido para o grego pelo neto do autor e sua tradução foi recolhida na versão grega da Bíblia dos judeus de Alexandria – versão conhecida pelo nome de “Septuaginta”. O nome “Eclesiástico” parece ser de origem cristã e indica que seu uso era muito frequente nas reuniões das primeiras comunidades.
O que nos interessa aqui é mostrar qual era a visão sobre a saúde entre aqueles que viviam em Jerusalém no segundo século antes de Cristo. Se percorrermos a história de outros povos, veremos que também entre eles a saúde era vista como um bem de valor inestimável. Atualmente, não é diferente. Não é nem preciso fazer uma pesquisa para descobrir que a saúde é atualmente a principal preocupação dos brasileiros – a saúde e um atendimento digno e de qualidade na hora da doença.
Em resposta a esse desejo (ou desafio?), a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil escolheu como tema da Campanha da Fraternidade deste ano de 2012: “A fraternidade e Saúde Pública”, e como lema: “Que a Saúde se difunda sobre a terra” (cf. Eclo 38,8). Antes que alguém me pergunte: “Mas o que a Igreja tem a ver com isso?”, antecipo uma observação: o Evangelho de Jesus Cristo é uma resposta a todas as necessidades humanas, e não só a necessidades espirituais. Por isso, somos chamados a olhar para Jesus Cristo e a buscar nele propostas para os problemas sociais que enfrentamos. Ora, em cada página do Evangelho o vemos debruçado sobre enfermos. O carinho que ele tinha pelos doentes e as curas que realizava se constituíam em um sinal da chegada do Reino de Deus entre nós.
A Igreja tem consciência de não ter respostas técnicas aos problemas da sociedade. Não sabe dizer, por exemplo, o que deve ser feito para que o “Sistema Único de Saúde” do Brasil cumpra a função para a qual foi criado – a de atender a todos, indiscriminadamente, transformando-se num modelo para o mundo. Mas a Igreja pode, sim, suscitar uma ampla reflexão que envolva toda a sociedade na discussão do SUS. Dessa reflexão poderão nascer ações transformadoras. Ações assim exigem conversão de mentes e de corações. Por isso mesmo, a Campanha da Fraternidade realiza-se sempre no tempo da Quaresma. Dito isso com outras palavras: a Campanha da Fraternidade de 2012 quer “refletir sobre a realidade da saúde no Brasil em vista de uma vida saudável, suscitando o espírito fraterno e comunitário das pessoas na atenção aos enfermos e mobilizar por melhoria no sistema público de saúde” (Objetivo Geral da CF).
Esse objetivo pode ser assim especificado: é preciso sensibilizar as pessoas para a prática de hábitos saudáveis, para o serviço aos enfermos e para a importância da organização da pastoral da saúde nas comunidades; difundir dados sobre a realidade da saúde no Brasil e seus desafios; despertar nas comunidades a discussão sobre a realidade da saúde pública; qualificar a comunidade para acompanhar as ações da gestão publica e exigir a aplicação dos recursos públicos com transparência, especialmente na saúde.
Num mundo como o nosso, marcado por progressos técnicos extraordinários, vemos que algumas questões continuam nos desafiando – por exemplo: as enfermidades, o sofrimento e a morte. Essas questões contrariam os anseios de vida e bem-estar que todos sentem. Sim, “todos”, isto é, ricos, pobres, crianças, jovens e idosos. Ninguém escolhe ficar doente. A doença se impõe. Na doença, somos iguais. Não é essa uma excelente razão, pois, para a enfrentarmos de forma fraterna e solidária? É justamente essa a proposta da Campanha da Fraternidade deste ano.
Dom Murilo S.R. Krieger, scj
Arcebispo de São Salvador da Bahia – Primaz do Brasil
Fonte: arquidiocesesalvador.org.br
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